domingo, 25 de agosto de 2019

Pensamento escrito


Há três anos escrevi um pequeno desabafo. Hoje, relendo-o, percebo quão atemporal ele é.



Mesmo com tantas reviravoltas e com a política como assunto principal nas mesas de bar e nas rodas de amigos, tudo no Brasil continua uma balela. As pessoas discutem, brigam, devoram-se, odeiam-se, defendendo um ou outro lado; mas, finalmente, acabam voltando para seus afazeres, para seu divertimento, para sua cerveja, para seu vícios. De APÁTICO o povo brasileiro passa a DEMAGOGO. De demagogo para hipócrita, não falta meia milha. Ou meia dúzia de stories.



                                                                  ***



Brasília, 16 de março de 2016.



Luís Inácio é um psicopata. Para mim não restam dúvidas. Inescrupuloso e sem consciência, ele acredita nas próprias mentiras e faz delas verdades. Eu preciso escrever. Preciso sair às ruas e protestar, protestos de verdade, não esses nos quais as pessoas se arrumam, tiram fotos e sorriem como se estivessem em pleno carnaval. Depois vão embora para suas casas na certeza de que cumpriram com seu dever cívico. Mas não.. eu não consigo escrever. Sinto como se me faltasse força física. Meu texto sai sem nexo ou coesão. Meu organismo parece estar me devorando e meus órgãos vitais parecem estar se comprimindo para que me falte a circulação sanguínea e a respiração. Se eu tivesse desde sempre orgulho de meu País, morrer seria uma opção. Ir às ruas, protestar contra toda essa tirania, com armas num derramamento de sangue que valeria a pena. Mas poderei eu morrer por algo que não acredito? Não, nunca acreditei nesse povo "heróico" e "bravo" cantado nos arranjos de Francisco Manuel da Silva. Esse, por sinal, tem sua parcela de corruptível, pois trabalhava ante a promessas do imperador. O povo brasileiro não é nação. Nações precisam estar unidas não em idioma e geograficamente, mas em ideologia. O Brasil é definido como laico, mas  "apático" julgo ser uma melhor definição. Mas o que fazer? Continuar com meus planos pessoais e continuar me considerando uma apátrida? Ou acordar para a realidade e pagar ao país o preço de minha dívida por ter errado grosseiramente ao votar? Sei que o que escrevo se contradiz, mas minha tristeza e vergonha beiram à inimputabilidade. Mas sim, sou responsável pelos meus atos e se, por ventura, um crime eu chegar a cometer, pagarei minha cota de culpa no berço dessa justiça injusta.

sábado, 17 de agosto de 2019

Psicose

"Norman Bates ouviu o som e estremeceu". Após anos de indiferença por um dos grandes clássicos de suspense e mistério do cinema, eis que me rendi ao livro. Indicado e emprestado pela minha prima caçula, rendeu-me um curioso divertimento após a longa jornada de um dia de estudos. 



O livro, muito menos conhecido que a famosa "menina dos olhos" de Alfred Hitchcock, foi publicado em finais dos anos 50 e quando o nosso cineasta decidiu passar a história para as telas do cinema, comprou todos os exemplares a fim de que o número mínimo de pessoas descobrisse o final. 

Loucura, incesto, mistério e tensão são alguns dos ingredientes dessa leitura. O mais inusitado é que toda essa carga pesada não compromete a leveza da leitura que, inesperadamente, chega a ser até divertida.

A edição da Dark Side é simplesmente belíssima, com folha de alta gramatura e com figuras de algumas das marcantes imagens do filme.

Boa leitura!


Pacheco - Capítulo 1, Parte 1.

A história que tem início hoje, mas que não se sabe ao certo quando e se terá fim,  tem a mera intenção de me descontrair. Se por acaso tiver, como efeito colateral, o entretenimento de outrem, será mera casualidade.

PACHECO

Pois bem, ele chegou assim, após selecionado em uma entrevista, dentre alguns candidatos interessados. E foi escolhido pela sua aparente simpatia e jeito de companheiro. Pois nesse lugar era isso que importava. 

Nos primeiros dias há sempre a adaptação. Uma gracinha aqui, um comentário ali, mas era importante demonstrar interesse nas tarefas a ele atribuídas. Ela, Fonseca, com aquela vontade de enturmar o outro e se auto-afirmar, foi adaptando seu novo colega temperando sua chegada com trotes e brincadeiras. 

Houve risos, reclamações, discussões e, enfim, um vínculo de amizade se formou. Aquele lá que era aparentemente introspectivo, uniu-se aos fanfarrões. A moça bela com jeito de menina e um tanto desajeitada e que, às vezes, fazia que trabalhava, achegou-se. Estabelecida estava aquela trupe.

Cafezinhos, um processo aqui e outro acolá, uns dias de penúria e outros nem tanto. Conversas, umas agradáveis e outras nem um pouco. A vida foi sendo levada naquele ambiente burocrático e cheio de vida. Desentendimentos e segredos revelados, causos mal contados. Pacheco se adaptou bem à nova repartição e foi muito bem recebido por aqueles que lá "jaziam". 

Pacheco tem um senso de humor único. Espirituoso como poucos, arrancava de todos muitas gargalhadas. "Que cara massa", diziam seus colegas. 

Ocorre que Pacheco, como outros muitos comediantes e bem humorados, também tinha seus lundus. Entristecia-se às vezes e não havia cristão que conseguisse tirá-lo daquela áurea macambúzia. Seja por uma discussão em casa com sua esposa ou por problemas financeiros, ou mesmo por algum motivo que nem ele mesmo sabia, Pacheco se aninhava em sua baia, colocava seu fone de ouvido e ia trabalhar. Sim, era estranho quando alguém ia à repartição só para trabalhar.

Descobriu-se após alguns meses que Pacheco fazia uso de anti-depressivos. Sim, o mesmo Pacheco que fazia todos rirem. Talvez, de tão engraçado que era e com tanta criatividade para elaborar boas piadas, ninguém conseguia fazê-lo rir e sentir-se regojizado. Não com sinceridade. Pacheco só ria de si mesmo. E quando cansava, precisava de ansiolíticos para aguentar o tranco da vida. 

Prosélito da camaradagem, não havia não em seu vocabulário quando o assunto era ajudar algum de seus colegas. Aliás, Pacheco era um homem fácil de angariar colegas, mas difícil de ser conquistado como amigo. Ficava ali, horas a fio trabalhando em meio a murmurinhos e gargalhadas, mas não envolvia ninguém em sua vida pessoal. Sabia bem separá-las. Seu lar era seu abrigo e seu segredo. Impenetrável como a toca de uma fuinha ou como o buraco feito pelas corujas do cerrado para esconder sua cria.

Não havia ninguém dali que um dia houvera visitado a casa de Pacheco e de sua família.

Pois bem, nosso figurão, no fundo, era uma boa alma, bom companheiro e generoso. Contudo, avesso às indiscrições quando o assunto era sua vida.

Foi a esse senhor que um dia, em tarde chuvosa pós-seca do centro-oeste brasileiro, quando os ipês já começavam a mudar de cor, que lhe roubaram um livro. Mas não era um livro qualquer, daqueles que a gente empresta, esquece e não nos devolvem.

(continua...)