"Condenado à morte! Já se vão cinco semanas que convivo com tal pensamento, sempre só com ele, sempre petrificado por sua presença, sempre encurvado sob seu peso!" É assim que começa O Ultimo Dia de um Condenado, obra de Victor Hugo que me convenceu em acabar por condenar a condenação. Meu "discurso" poderá até parecer redundante, mas a repetição da demonstração do desespero do personagem do livro é que me fez perceber o quão insana é a ideia da pena capital: uma afronta a valores basilares de uma civilização.
O personagem era um homem livre que, por alguma vicissitude, acabou preso e condenado à morte por um colegiado de juízes e pela plateia que ao julgamento assistia. Não passava pela cabeça do personagem que seria condenado à morte, razão pela qual, talvez, o crime não tenha sido tão grave... Por isso mesmo é interessante ressaltar que em nenhum momento fica claro qual o crime cometido. E no fim você acaba por perceber que não faz diferença. O condenado se perde em pensamentos os mais fantasiosos e oníricos. Ademais, percebe-se no livro que não só homicídios consumados, como tentativas e até mesmo meras ameaças eram capazes de ensejar a condenação à pena de morte.
O personagem oscila, no decorrer da história, entre a resignação e o desespero. Antes dizia preferir a morte às gales. Com o dia se aproximando, até a eternidade como galeote era preferível a inexistência de súbito. Ao passo que o tempo vai passando, este último se apodera da situação. Quando lhe e comunicado, por exemplo, que a pena será executada naquele mesmo dia, o desespero assume a preponderância até o último momento - quatro horas. Pensa em fugir, em cavar um buraco - vê que não há tempo, no caminho pensa em uma saída - na chegada pede clemência... E imagina até o último minuto que algo poderá interceder em seu favor. Será próprio do ser humano, então, manter a esperança, mesmo que tão-somente um fio dela, até mesmo nas situações mais catastróficas?
Comovente o momento em que o personagem lamenta pela mãe, pela esposa e pela filha - as quais ele denomina de três viúvas da lei -, três órfãs de espécies diferentes.
O saudoso autor de Os Miseráveis, como todos sabem, era um gênio versátil e que em muitas ocasiões "virou a casaca". Contudo, em A Tentação do Impossível Mario Vargas Llosa - p.18 - afirma que a questão da pena de morte foi um dos poucos tópicos sobre os quais Victor Hugo lutou contra durante toda a sua vida.
Victor Hugo, além de formador de opiniões, é didático. No capitulo XV, algo me chamou a atencao. Ele cta o caminho completo ao matadouro, suas 3 paradas: Bicetre, Conciergerie, la Greve. Também, no capitulo XXVII, nosso escritor emite a opinião do personagem acerca da guilhotina: 10 letras que descrevem toda a sua crueldade, o mesmo nome do mestre infame que a criou.
"Sinto meu coração cheio de raiva e exasperação. Acho que o bolso de fel acaba de estourar. A morte nos torna maus." Livro impecável, super rápido de ler e de fácil compreensão, o que torna a obra ainda mais valiosa. Um livro que não é esquecido, pela sua carga de conteúdo e defesa, ao menos sob o meu ponto de vista, da dignidade da pessoa humana, ao passo que sedimenta os princípios consagrados pela Revolução Francesa que os seus próprios instrumentos mitigaram.